segunda-feira, 23 de março de 2009

Ninguém queria, todos quiseram.

— Oi lá!
— Como vai, tudo bem?
— Ah, vamo indo, n'é?
— Pois é, tá sabendo do fim-de-semana? Tô fazendo um evento que mistura DIVERSÃO e CULTURA, a micareta SERTANEJA. A Atração da sexta é o D2, a do sábado é um grupo de tradição. Domingo a gente se reúne pra resenhar em algum lugar, cada um com seu núcleo social.
— Poxa, que evento bacana!

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Bem, se vc é daqueles que não vê diversão no carnaval temporão, com calça tora-bago e chapéu, que dirá de cultura. Vá lá! Todo mundo em cima do trio! Faz parecer que o freguês quer ser mais Goiás que os goianos e mais Bahia que os baianos. Aliás, parecer é bondade. Enquanto isso a gente vai esperando um show diferente, sem ressucitar cadáveres e/ou recorrer ao apelo de misturar diferentes tribos num lugar. Pra mim isso é desculpa. Furada.

De um tempo pra cá dá-se muita importância pro lado comercial. Um cara cria um pássaro pra ser o mais o belo de sua espécie, daí quando ele tá pronto, crescido, vistoso, o cara leva o bicho pra apreciação dos entendidos. Chega lá, solta o bicho na mesa, o primeiro vem e lhe tosa o rabo, o segundo aproveita e tosa o topete, o terceiro estica o pescoço e o enrola um pouco como se tivesse passando uma tesoura no papel para fazer cachos e o quarto aproveita as penas tosadas pra fazer um arranjo na cabeça do bicho. Tudo pra vender melhor. Ninguém quis nem olhar pro pobre pássaro na sua humilde autenticidade e originalidade.

Pior, que se a gente for xingar o Promôter por causo do CULTURA a gente tá errado. Acaba sendo cultura mesmo. A gente tá cansado de ver micareta aqui em MG, rodeio então nem se fala; Eu não nego que sejam um grupo social, com práticas e ações sociais comuns aos membros – que se DIVERTEM realmente em cima do trio – além de crenças, comportamentos, valores morais, instituições e axiomas.

O foda é ter que aguentar essa porra toda sempre, só com roupa diferente.

Quando foi a vez de fazer de Divinópolis uma cidade, lá no comecinho da década de 1910-1920, ninguém queria, todos quiseram.

Pra quem não entendeu a metáfora: por enquanto, transformar arte em evento e associá-los às tags { dinheiro, sucesso, propaganda, expansão } parece uma idéia totalmente inviável aqui no Espírito Santo da Itapecerica. Se, por um acaso remoto, isso vir a ser um sucesso de retorno financeiro, vai chover de jovem querendo ser o dono da porca. Tomara.

Evento por evento, eu prefiro os de arte aos de masturbação sócio-econômica. Pelo menos a gente fica com a sinceridade e autenticidade ao invés de ser o popular de sempre que se consome sem atenção. E que seja arte de qualquer jeito, com viola, guitarra, pincel, filme, foto, sapatilha ou tutu. Cheio de gente querendo mostrar alguma coisa que fatalmente agrada e cheio de personalidade, tão mais cheio de vida e experiência do que a maioria das merdas globais, com algumas exceções, craro.

De tarde, o outono sem sombras. O sol à 95 graus em relação ao Equador deixa tudo quente, muito quente. Vou tocar teclado.

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